Trinta e nove anos. Trinta e nove anos desde a revolução que derrubou
o poder fascista que dominou o país durante demasiado tempo. Trinta e
nove anos de democracia, de eleições, de liberdade, de progresso social,
de maior igualdade, de justiça. Trinta e nove de valores de Abril, ou
pelo menos a vontade de aplicar esses valores de Abril da melhor maneira
possível.
E durante trinta e nove anos, a direita que derrubámos foi aceite no
seio do regime. A direita que promove a desigualdade, o darwinismo
social e que existe para manter e proteger os interesses instalados. A
direita que luta contra o progresso, a justiça e a possibilidade de quem
nasce pobre chegar a ter algum conforto material e felicidade. A
direita que prefere ver serviços que devem ser públicos - a saúde, a
educação - nas mãos do lucro privado. A direita das corporações,
herdeira da direita salazarista que durante cinquenta anos protegeu um
reduzido número de grandes empresas que viviam à sombra do Estado. A
direita que prefere o respeito pelas instituições ao direito ao
protesto, o consenso às eleições, a manutenção de uma paz podre a dar
voz ao povo que não ser revê em quem nos governa. A direita que, pela
voz de Cavaco Silva - o
antigo colaboracionista do Estado Novo que sempre se regeu pelo rancor, pela mesquinhez e pelo ódio à democracia -
acaba de proferir na Assembleia da República o mais despudorado discurso anti-democrático que alguma vez se ouviu em democracia.
Sejamos claros: esta direita não é a direita social-democrata, a
direita do PSD de Francisco Sá-Carneiro. Mesmo os adversários políticos
deste lhe reconheciam sólidos fundamentos democráticos. Esta direita já
nada tem a ver com Sá-Carneiro. Esta direita é a direita revanchista, a
direita que escarnece e desdenha o 25 de Abril em favor do 25 de
Novembro - porque este significou uma oportunidade de regresso ao 24 de
Abril. É a direita que reconhece implicitamente nos valores de Abril uma
ameaça para o poder a que aspira. É uma direita que não merece usar os
cravos na lapela que hipocritamente ostenta nesta data. É a direita que
fecha as galerias da casa da democracia ao povo, porque tem medo dele. É
uma direita que trai, a cada segundo de permanência no poder, os
valores de Abril.
In Blog " ARRASTÃO"